Posso pedir progressão de regime durante a pandemia?
Sem dúvidas, 2020 é o ano que marcou a vida de muitas gerações. A pandemia do novo coronavírus (COVID-19) trouxe várias realidades diferentes para as vidas das pessoas: a dificuldade do isolamento social, o medo da doença, problemas financeiros e, principalmente, o sofrimento de perder alguém próximo.
O que queremos dizer é que, infelizmente, ninguém vai passar pela pandemia ileso, ela vai deixar uma marca em todos nós. Quem não abandonou um sonho? Perdeu alguém próximo, teve problemas financeiros ou desenvolveu alguma enfermidade causada pelo isolamento social?
Durante muito tempo, pesquisadores de diversas áreas ainda vão continuar estudando os impactos sociais, culturais, políticos e econômicos causados pela pandemia do novo coronavírus em todo o mundo. E, certamente, veremos a era do COVID-19 contada nos próximos livros de história.
No âmbito jurídico não foi diferente, durante a pandemia estão surgindo diversas discussões sobre o impacto do COVID-19, o aumento dos casos de violência doméstica ou as suspensões do contrato de trabalho, por exemplo.
Contudo, o nosso foco neste artigo é a relação entre o impacto causado pela pandemia nos sistemas prisionais brasileiros e as mudanças trazidas para a progressão de regime e liberdade provisória.
O Brasil tem uma das maiores populações carcerárias no mundo, além disso, a média nacional da taxa de ocupação dos presídios é de aproximadamente 165%, ou seja, há uma superlotação nos estabelecimentos prisionais, isso sem contar a precariedade estrutural, condições insalubres e falta de alimentação e educação adequada.
É certo de que a superlotação nos estabelecimentos prisionais configura um desrespeito a dignidade da pessoa humana, portanto, um desrespeito à Constituição Federal e a todo sistema de Justiça, mas, além disso, o surgimento da pandemia ocasionou uma nova preocupação: o aumento do número de infectados e no número de óbitos nos estabelecimentos prisionais, sejam eles presos, funcionários ou visitantes.
Uma das medidas possíveis para minimizar o problema da superlotação dos estabelecimentos prisionais é a antecipação da progressão de regime. E é sobre isso que vamos tratar a partir de agora. Se interessou? Então, continue lendo este artigo!
Quem tem direito a um pedido de progressão de regime em 2021?
Antes de sabermos os requisitos que se deve cumprir para a solicitação, precisamos entender o que é a progressão de regime.
O pedido de progressão de regime é um direito de qualquer pessoa que esteja cumprindo pena. Como o nome já supõe, é uma progressão, um avanço gradativo, na maneira como o indivíduo está cumprindo a pena. No Brasil, existem três regimes de cumprimento de pena: o fechado, o aberto e o semiaberto.
Logo, quando ocorre a mudança de um regime mais rigoroso, gravoso, para um regime mais leve, brando, estamos diante da progressão de regime. Ela ocorre de maneira gradual e se sujeita ao cumprimento de dois requisitos.
Em 2021, terão direito à concessão do benefício de progressão de regime os presos que cumprirem o requisito subjetivo e o requisito objetivo.
O requisito subjetivo diz respeito ao bom comportamento do preso, a lei é clara quando diz que "o apenado só terá direito à progressão de regime se ostentar boa conduta carcerária."
O requisito objetivo refere-se ao fato de que o preso deverá cumprir uma parte da sua pena total, para então surgir o direito de progredir de regime. São frações da pena total do apenado, que estão dispostas no Artigo 112, da Lei de Execução Penal, e variam de acordo com o crime cometido e se há reincidência ou não.
Preparamos um conteúdo completo sobre progressão de regime, lá você vai encontrar, além de todos os requisitos objetivos, como calcular a progressão de regime, quais os regimes prisionais no Brasil, exemplos e muito mais. Acesse aqui.
De qualquer maneira, conforme sugerimos na introdução deste texto, a pandemia do novo coronavírus trouxe alguns questionamentos sobre a superlotação dos estabelecimentos prisionais no Brasil, fato que afetou temporariamente as regras sobre a progressão de regime.
Como a pandemia afetou a progressão de regime?
Durante a pandemia, alguns advogados entraram com pedido de progressão de regime antecipado, ou seja, o apenado ainda não havia cumprido todo o tempo necessário estipulado em Lei para que seja concedida a progressão de regime.
Contudo, as alegações eram de que a situação da pandemia trazia risco a todo o sistema carcerário e as pessoas envolvidas nele, pois há maior risco de contaminação, visto que a superlotação dos presídios torna ineficaz qualquer medida tomada para evitar a proliferação do vírus, sem contar a falta de alimentação adequada, falta de higiene nas celas e no aspecto pessoal do preso.
A própria Lei de Execução Penal preceitua que é dever do Estado garantir aos presos assistência à saúde. Com isso, durante a pandemia houve algumas decisões concedendo o benefício de progressão de regime, em caráter excepcional e peculiar, quando o apenado encontrava-se em grande risco de contaminação pelo vírus.
A discussão ganhou repercussão nacional no mundo jurídico. Enquanto alguns defendiam o posicionamento da concessão antecipada da progressão de regime, outros operadores do direito entendiam que a pandemia do novo coronavírus é argumento insuficiente para que seja autorizado a antecipação do benefício, defendendo que o apenado deveria cumprir todo o lapso temporal estipulado em Lei para ter direito à progressão.
O que mudou no pedido de progressão de regime durante a pandemia?
Em março de 2020, o Conselho Nacional de Justiça - CNJ, publicou a Recomendação nº 62, que instrui aos Tribunais e magistrados algumas medidas preventivas contra a proliferação do COVID-19, no âmbito do sistema de justiça penal e socioeducativo.
Dentre as medidas adotadas pela Recomendação nº 62, o documento no seu artigo 5º, recomenda que os magistrados considerem a concessão da progressão de regime de maneira antecipada, sobretudo em relação às:
a) mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até 12 anos ou por pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, pessoas com deficiência e demais pessoas presas que se enquadrem no grupo de risco;
b) pessoas presas em estabelecimentos penais com ocupação superior à capacidade, que não disponham de equipe de saúde lotada no estabelecimento, sob ordem de interdição, com medidas cautelares determinadas por órgão de sistema de jurisdição internacional, ou que disponham de instalações que favoreçam a propagação do novo coronavírus;
Em setembro de 2020, a CNJ publicou a Recomendação nº 78, acrescentando que tais medidas de antecipação da progressão de regime não podem ser aplicadas em crimes de organização criminosa, crimes de lavagem de dinheiro, crimes contra a administração pública, crimes de violência doméstica ou crimes hediondos.
A Recomendação nº 62, da CNJ, foi prorrogada em setembro de 2020, pelo Ministro Luiz Fux, logo, as recomendações podem ser aplicadas até 12 de março de 2021.
Vale lembrar que a recomendação não especifica nenhum parâmetro temporal para que seja aplicado a antecipação da progressão de regime. Ou seja, não há critério objetivo para antecipar o cumprimento deste requisito pelo apenado.
Contudo, a jurisprudência tem entendido que os apenados poderão ter concedida a progressão de regime quando faltarem 120 (cento e vinte) dias para que se cumpra o lapso temporal. Assim recomendou a Defensoria Pública e decidiu o ministro Edson Fachin (STF), no julgamento da liminar no HC 188820 / DF.
Como fazer um pedido de progressão em 2021?
O pedido de progressão de regime deverá ser interposto por petição direcionada à vara de execução penal, que conterá o resumo do pedido e a comprovação de que o apenado cumpre o requisito objetivo e o requisito subjetivo.
Com essas mudanças decorrentes da pandemia do novo coronavírus. Basicamente, o pedido de progressão de regime deverá demonstrar que o apenado:
pertence ao grupo de risco para a COVID-19 ou é gestante, idoso, indígena, mãe ou responsável por menor, possuir deficiência;
esteja em estabelecimento prisional com lotação acima da sua capacidade;
não cumpra pena por crime de organização criminosa, crimes de lavagem de dinheiro, crimes contra a administração pública, crimes de violência doméstica ou crimes hediondos;
faltem 120 (cento e vinte) dias para completar o lapso temporal necessário para a progressão, conforme estipula a Lei de Execução Penal;
Não podemos esquecer de que deverá ser comprovado que o apenado possui bom comportamento no estabelecimento prisional em que está encarcerado, atendendo assim ao requisito subjetivo.
Vale ressaltar que o juiz poderá negar o pedido de progressão de regime, caso verifique que não existem casos de COVID-19 no presídio ou, ainda, caso o estabelecimento prisional tenha atendimento médico adequado e adote medidas preventivas contra a contaminação do vírus.
Como comprovar o mérito?
Uma boa redação jurídica no pedido de progressão de regime é essencial para que se discuta o mérito da concessão do benefício. Por isso, considere a atuação de um profissional experiente e especializado na área.
De todo modo, não se faz mais necessário comprovar tamanha calamidade provocada mundialmente pela pandemia do novo coronavírus, é um momento crítico que ocasionou a morte de mais de 2 milhões de pessoas em todo mundo.
Fora isso, deve-se comprovar que o estabelecimento prisional tem estrutura sanitária precária, falta de atendimento médico adequado e nenhuma perspectiva para prevenir a proliferação do vírus.
A progressão de regime não é o único instituto jurídico discutido durante a pandemia, outro benefício analisado pelos operadores de direito de todo o país foi o da liberdade provisória, que veremos nos próximos tópicos.
Qual o posicionamento de liberdade provisória para detentos sem condenação definitiva em decorrência da COVID 19?
Quando uma pessoa pratica um delito, o juiz, atendendo os requisitos legais, poderá decretar sua prisão preventiva, assim, o acusado aguardará julgamento do seu processo em um estabelecimento prisional, como um preso provisório, pois ainda não há condenação definitiva contra ele.
A liberdade provisória é o instituto jurídico que possibilita que o acusado responda o crime em liberdade, ou seja, durante todo o trâmite de investigação e julgamento da ação penal, o acusado ficará solto.
Se você quiser entender melhor sobre liberdade provisória, acesse aqui, o conteúdo completo sobre o assunto no nosso site.
Em relação às mudanças decorrentes da pandemia do COVID-19, a Recomendação nº 62, em seu artigo 4º, recomendou que os magistrados reavaliassem as prisões provisórias, priorizando:
a) mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até doze anos ou por pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, pessoas com deficiência ou que se enquadrem no grupo de risco;
b) pessoas presas em estabelecimentos penais que estejam com ocupação superior à capacidade, que não disponham de equipe de saúde lotada no estabelecimento, que estejam sob ordem de interdição, com medidas cautelares determinadas por órgão do sistema de jurisdição internacional, ou que disponham de instalações que favoreçam a propagação do novo coronavírus;
c) prisões preventivas que tenham excedido o prazo de 90 (noventa) dias ou que estejam relacionadas a crimes praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa;
Contudo, a reavaliação das prisões provisórias tem ido além destas três hipóteses. Como no caso, por exemplo, da concessão de liberdade provisória com o pagamento de fiança. Existe decisão judicial recente que concedeu a liberdade provisória aos presos que, mediante pagamento de fiança, tiveram a concessão deste benefício, mas não possuem condição financeira para fazê-lo.
O argumento do pedido de liberdade provisória nesse sentido, baseia-se no fato de que a pandemia causou consequências enormes para a economia de todo o país, muitas pessoas perderam seus empregos ou mantiveram seus negócios fechados durante o isolamento e, agora, sofrem com problemas financeiros.
Diante disso, a jurisprudência tem considerado que a pandemia do COVID-19 é argumento suficiente para concessão da liberdade provisória aos acusados presos provisoriamente, mas que não efetuaram pagamento de fiança, por questões financeiras.
De qualquer maneira, observe que cada caso será analisado pelo seu contexto fático, por isso, o melhor caminho é procurar um profissional especializado, visto que é ele que vai saber averiguar minuciosamente cada situação, para que seja possível garantir todos os seus direitos.
Os presos podem responder em liberdade por conta da superlotação dos presídios em decorrência da pandemia?
A resposta é sim! Conforme mencionamos, uma das mudanças para concessão da liberdade provisória em decorrência da pandemia do novo coronavírus foi que os magistrados deveriam reavaliar as prisões provisórias de pessoas presas em estabelecimentos penais que estejam com ocupação superior à sua capacidade física.
Além disso, a Recomendação que prevê essa medida, entende que para esta concessão não deve haver no estabelecimento prisional lotação de equipe de saúde.
Outro ponto para reforçar o pedido de liberdade provisória são os estabelecimentos que possuam estrutura física, instalações que venham a favorecer a proliferação do vírus, como por exemplo, celas sem circulação de ar, mal higienizadas.
De todo modo, no Direito, cada caso é um caso, que vai ser analisado de acordo com a Lei e com as mudanças feitas para combater a pandemia do COVID-19. Por isso, sempre considere a atuação de um profissional experiente e especializado na área.
Ficou alguma questão? Entre em contato com a gente. Nós, da Gracia Bernardo Filho Advogados, estamos prontos para te orientar.
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